Em seu ateliê, era possível ver o a o como lindas peças saíam da natureza por meio de suas mãos habilidosas e apetrechos ancestrais. Os fios não vinham do armarinho, prontos e enrolados em um tubo. A lã ou algodão eram recebidos por ela em estado bruto, cardados (processo de desemaranhar as fibras), fiados e, no tear, transformados em roupas, mantas, cobertores e tapetes. A cor vinha do quintal, de cujas flores, ervas e folhas saíam as tintas naturais que produziam os tons pastel irrepetíveis de suas peças. Até da casca de cebola saía o laranja que ela utilizava. 154n28

O conhecimento da técnica vem de gerações adas – a mãe e a avó, que além de tudo ainda colhiam o algodão e tosqueavam carneiros para ter matéria-prima, foram suas professoras na tecelagem – e de outro estado: Minas Gerais, onde Zélia nasceu. Porém, levou anos para que se manifestasse como ofício. Antes, mudou-se para Mandaguari com a família, no fim da década de 1940. Casada com o lapeano José Wille Scholz, morou em Paranavaí e Maringá até 1972, quando firmaram residência em Curitiba para poder oferecer aos filhos educação mais avançada.

No fim dessa mesma década, Zélia levou os rebentos para uma aula de cerâmica no Centro de Criatividade de São Lourenço. Conversa vai, conversa vem, a responsável pelos cursos do local, Teca Sandrini, descobriu o ado tecelão da mineira e a convidou para ministrar aulas. O interesse foi grande e os alunos se multiplicaram. Por anos, lecionou no Centro e em classes domésticas, colaborando para a perpetuação da fabricação artesanal de tecidos do zero. Com seu trabalho, ajudou a comprar a casa em que a família morou a vida toda, no Alto da XV, marcada por um alto pinheiro que ela mesma plantou quando chegou a Curitiba, e que um dia foi árvore de Natal na sala.

Zélia Scholz faleceu aos 89 anos, deixando sete filhos e 15 netos (Foto: Marcos Garcia Tosi)

A portadora da licença número 1 da tradicional Feira do Largo da Ordem era praticamente um ponto turístico. Uma plateia se formava para vê-la domar a roca de fiar. Chegavam em especial as crianças, e ela não reclamava, pois tinha paixão pela natureza, crianças e livros. O jornalista Cley Scholz, filho de Zélia, lembra da mãe à luz de velas lendo autores clássicos brasileiros como Monteiro Lobato, Olavo Bilac e José de Alencar. A sede de saber não esmoreceu quando ela precisou deixar o ensino básico para ajudar a cuidar dos 13 irmãos mais novos. Com 68 anos de idade concluiu o Ensino Médio e até prestou vestibular para Artes Plásticas.

Zélia da Roca de Fiar – que sempre se prontificava a ajudar quem precisasse, especialmente quem, como ela, vinha do interior para a capital – continuou sendo um ponto de luz por onde ou até o fim da vida. “Ela sempre tinha palavras de inspiração. Quando via algo da natureza, o céu, a flor, a criança, era algo impressionante”, lembra o filho Cley. Zélia teve seis filhos e adotou um sétimo. Deixa também 14 netos e um a caminho.

VEJA TAMBÉM: