Entre os que optaram pela declaração simplificada, a maior parte (88,5%) é de contribuintes com renda de dois a 15 salários mínimos, segundo levantamento feito pela Unafisco (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal), a partir de dados da Receita Federal.

As pessoas com renda entre dois e cinco salários mínimos correspondem a 40,10% dos contribuintes que optaram pela declaração simplificada. Pessoas com renda entre cinco e dez salários mínimos são 36,70% do total.

Pela classificação usada pelo IBGE, 76,80% das pessoas que declaram o IR simplificado estão nas classes C e D, ou seja, têm renda entre dois a dez salários mínimos.

A classe B, que tem renda de 10 a 20 salário mínimos, até chega a usar a declaração simplificada, mas está longe de ser a predominante. Somente 15,40% das pessoas da classe B optam pelo modelo simplificado. Já a classe A (renda superior a 20 salários mínimos) praticamente só usa a declaração completa, já que têm muitas deduções a fazer.

Especialistas criticam a ideia

Especialistas consultados pela Gazeta do Povo criticam a ideia de acabar com o desconto automático. Eles afirmam que é um modelo simplificado que funciona há décadas e facilita o trabalho do contribuinte e do próprio Fisco no pente-fino das declarações.

“Nunca houve críticas ao modelo simplificado. As pessoas sempre viram como uma forma de agilizar e a própria Receita nunca se preocupou em mudar a dinâmica, porque sabe que, se quer arrecadar mais, deve cobrar mais impostos e colocar a lupa sobre aqueles que ganham mais, que optam pela declaração do modelo completo”, explica o presidente da Unafisco, Mauro Silva.

“É uma medida que prejudica o contribuinte e o próprio Fisco. A pessoa que não tem renda não tão alta, ela não tem costume de guardar comprovantes de despesa médica. Os contribuintes vão ter muitos problemas na hora de fazer a declaração completa. Vai acabar caindo um monte de declaração na malha fina. E esse mesmo número de auditores vai ter milhões de declarações a mais para ar a lupa”, afirma Thiago Barbosa Wanderley, advogado tributarista sócio do Ogawa, Lazzerotti e Baraldi Advogados.

Eles também dizem que, quase que inevitavelmente, os contribuintes vão acabar pagando mais imposto ao Leão sem o desconto automático. “É uma medida altamente regressiva, porque vai atacar a parcela mais vulnerável da população que declara o IR, que são as classes baixa e média. Quem já opta pelo modelo simplificado, normalmente, já não tem plano de saúde, gastos com educação privada. São pessoas que não vão conseguir deduzir seus gastos e vão pagar mais imposto”, diz Wanderley.

Silva diz que, ao invés de o governo anunciar medidas para melhorar a eficiência tributária e combater a sonegação, está focando no contribuinte, principalmente aquele com renda salarial entre dois e sete salários mínimos. “Isso é efeito colateral do teto de gastos, que obriga cortar gastos e o desconto simplificado é um gasto tributário para a União.”

O presidente da Unafisco defende que o governo reveja as isenções tributárias. “Bastaria eliminar 20% dos privilégios que são as isenções tributárias que teríamos quase 60 bilhões de reais por ano, o que é muito maior que o governo vai arrecadar com o fim do desconto padrão”, estima Mauro Silva.

O tributarista Thiago Barbosa Wanderley também defende que o governo olhe menos para “tirar” dinheiro do contribuinte e e a fazer o dever de casa. “Governo tá olhando muito para o contribuinte e pouco para si próprio. É preciso fazer uma revisão dos gastos públicos.”

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Com a proposta, governo quer aumentar a arrecadação

A ideia de acabar com o desconto simplificado é da equipe econômica e foi divulgada pelo jornal Folha de São Paulo. Seria uma forma de aumentar a arrecadação do governo nos próximos anos, a fim de ajudar a financiar o programa social Renda Cidadã e até mesmo a perda de receita que a União terá com a provável manutenção da desoneração da folha a 17 setores da economia.

Ao mesmo tempo, o governo abandonaria a ideia de acabar com as deduções de educação e saúde, que privilegiam as classes média e alta. Essa ideia estava sendo gestada dentro do Ministério da Economia desde o ano ado, mas não agradou o presidente Jair Bolsonaro. Sobre o fim do modelo simplificado, o presidente não se manifestou publicamente.

As novidades devem constar no restante da reforma tributária do governo. As partes pendentes preveem aumento da faixa de isenção do IR da pessoa física; alíquota extraordinária para salários elevados; redução do IR pessoa jurídica, com a contrapartida de taxar dividendos; mudanças no IPI; e criação de um imposto digital para desonerar a folha para todos os setores.

O governo ainda não sinalizou quando enviará o resto da reforma tributária ao Congresso. É provável que fique para 2021.